quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

O início, o fim e o meio

Há aquela surperstição de escolher as últimas coisas que vão se vestir, fazer, ouvir, falar no último dia do ano. As pessoas preparam comes e bebes, separam a sua roupa com a cor simbolizando seus desejos para o novo ano que chegará e fazem promessas.

Eu fiz diferente: hoje, escolhi a primeira música do último dia do ano, não a última. Bohemian Rapsody para começar o último dia do ano que mudou a minha vida.

A alta cúpula nerd já previa: 2009 será o ano do Nhonho. O ano do bizarro. De certa forma, foi. Em toda metamorfose, a fase mais importante da transição deixa o bicho meio assustador, amorfo.
Em 2009, nos primeiros dias do ano, a vida foram agonias, incertezas, esperas. Quase todas desnecessárias e inúteis. Muita energia desperdiçada e dissipada em receptáculos incapazes e indignos de recebê-la.
Em 2009, houve o primeiro trabalho de gente grande e grandes responsabilidades. Os problemas reais e prosaicos do ofício com os quais temos que aprender a lidar. Houve o encontro Asterístico, Radiohead, São Paulo, ah, a bela Sampa de Caetano.
Em 2009, muita gente importante viajou, ensinando o quanto é importante aprender a lidar com a distância, e o quando deve-se valorizar os amigos que se fez na juventude, porque os laços feitos nessa fase são muito diferentes do que se conseguem fazer na fase adulta. Aliás, 2009 foi o ano de descobrir o que é ser adulto. E, talvez, começar a gostar dos bônus que isso pode trazer.
2009 foi ano de pontos finais, e o final de 2009 é tempo de excelentes começos. Vários começos que prometem longos e seguros meios e fins não tão trágicos. 2009 foi ano de aprender a engolir o choro e andar, e que andando se esquecem os minutos que passaram e se lembra dos muitos que seguirão.
Fim de 2009 está sendo tempo de reafirmar, deixar os nós cada vez mais apertados, mas só os nós que realmente importam. Tempo de sentir uma saudade muito mais consciente dos que não estão perto, mas que fazem questão de se fazerem sentir bem juntinho nas horas importantes. Através de uma palavra, um recado, uma vibração virtual.

Hoje é dia de queimar e esquecer o que não se quer no futuro.







Esse não é o último post do ano. Prefiro sentir que é o primeiro post do último dia de um ano que resolveu dúvidas e apontou muitos bons caminhos.
Porque o passado não existe, nele nada pode ser mexido. Nós somos sujeitos e, assim sendo, somos agentes que devem realizar ações nos tempos. No passado, tudo é imutável.
Que o nossos presentes e futuros em 2010 sejam matéria de nossas ações, lúcidas sempre. Certas ou não, que essas ações nos levem acima do que já somos e que se afastem de nós aqueles que não nos levem a esse caminho.

De mim, junto, e com muita certeza, aqueles que carregaram meu 2009 nas costas junto comigo. E aqueles que vou carregar para sempre somatizados em cada sorriso meu, e em cada sofrimento. Os meus amigos queridos.
Dedico todas as coisas que fiz e que conquistei esse ano a vocês.
Até ano que vem. A gente se encontra, que eu sei, que eu vivo somente por isso.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Acadêmica, oh noes!

Essa semana, descobri que sou muito, mas muito acadêmica. Que acredito, de coração, que teoria é necessária, que existe literatura boa e ruim, que deve-se ou não ler esse ou aquele livro por motivos justificáveis.

Descobri que minha vida persegue regras e cânones: que gosto quando me dizem o que é certo o que é errado e quando me dão argumentos bons.

Hilda é adjetivada constantemente como transgressora. Dizem que sua literatura ou é difícil ou é xula. Por que putaria de Hilda Hilst ou de Bucowski é boa literatura e Paulo Coelho não é? Só porque ele diz coisas do tipo "tudo conspira a seu favor" enquanto Hilda cita a palavra "cu" diversas vezes?
Acho que é por causa de perguntas como essas que eu acho que deve ser feita a teoria. A literatura pode, sim, ser natural e descompromissada com propósitos estéticos, mas quando é publicada se torna passível de críticas (boas ou ruins, a saber).

Em umas conversas, ouvindo mais do que falando (alteridade mode), descobri o quanto sou acadêmica. O que nem me surpreende muito, porque sempre adorei as regras, elas me dão segurança. Mas quando esse tipo de coisa é notado por uma segunda pessoa e quando esta segunda pessoa está se tornando muito próxima a ponto de ser uma ameaça, a descoberta fica um pouco mais assustadora. Sou acadêmica! Ainda sirvo?

E meus pés, costurados ao chão, só avançam nesse sentido, enquanto meu coração me leva na direção contrária. Falar, ouvir, pensar. Livremente?

Mas que este gato quentinho nunca mais se banhe na água fria. Ele não vai.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Fins?

As reticências são os três primeiros passos do pensamento que continua por conta própria o seu caminho.

Mário Quintana

Dando um ponto final em toda essa coisa de vaca, ruminantes e esterco, vou falar é dessa coisa de fim.

Fim de ano, fim de curso, fim de amizade, fim de paciência, fim de ilusão, fim de estágio, fim de memória. FIM.
Costumo dizer para os alunos que todos eles sabem, sim, escrever um texto na sequência certa. Afinal, todos nós, quando falamos, estruturamos nosso discurso em uma sequência lógica, bem ligada a nosso objetivo de comunicação. Tudo bem, uns são muito mais bem sucedidos do que outros, mas em todos os discursos formais ou informais que circulam por aí, podemos encontrar início, meio e fim.

Quando pequenos, na escolinha, a gente vê isso demais: os seres nascem, crescem, se reproduzem e morrem. Por que os livros de ciências insistem em omitir as partes mais interessantes das coisas? (ao menos eles citaram a reprodução).

Assim como nos discursos e nas teorias de aula de ciências, a vida da gente passa por uns ciclos, normalmente marcados por importantes acontecimentos ou na vida familiar, ou pessoal, ou profissional. Ou combinações possíveis desses três elementos.
O calendário anual, por exemplo, é um ciclo temporal que funciona mais ou menos para todo mundo. Todos nós sentimos que o fim de ano é época de decidir coisas, planejar outras, reafirmar umas, deletar outras. É tempo de decisão, tempo de transição. Porque parece que o ano seguinte é mais uma chance de acertarmos onde queríamos e não conseguimos. Parece que se apaga tudo e a gente nasce de novo. A gente zera o relógio.


Meu ano novo começou um pouquinho antes do de todo mundo.

Com oportunidades aparecendo naturalmente, com antigos problemas sendo completamente superados, com formatura, reafirmação de amizades realmente importantes, de novos ares, novos olhares, novos sorrisos. De reconhecimento. De receber abraços efusivos de alunos que dedicam a você a vitória deles na vida. E tudo isso justamente quando não havia plano algum: os próprios planos se planejaram e apareceram prontinhos, na mais perfeita ordem.

Para mim, fim de ano não é época de comprar presentinho pra quem você gosta. É tempo de reafirmar a sua identidade e descobrir que ela depende também dos outros (esse sim é o presente que você ganha de alguns deles). E descobrir que se é sempre outro, a cada ano.
Fim de ano, agora, é tempo de listar tudo aquilo que você queria ter feito e fez. E ficar feliz por isso. E esquecer o resto da lista: o que não aconteceu não existiu. 

Também é tempo, sim, de fazer a nova lista de planos a serem realizados. Planos, não sonhos. Porque essa palavra faz dos planos sempre um pouco irrealizáveis.

A minha de 2010 vai começar com uma enorme reticência. E terminar também.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Do chão ao céu, da boca ao reto¹

Assim como demoro para digerir algo - já disse aqui centenas de vezes que rumino, como as vacas - o processo de explulsão da coisa acontece de modo semelhante ao dos bichinhos das pastagens.
O capim fica na boca: eu mastigo, engulo, ele volta, mastigo de novo. Quase dá pra pensar que a comida nunca vai parar de subir. É bem desesperadora esta fase.

Eis que certa hora, de supetão, aquilo não volta mais. Segue seu caminho do estômago, rumo ao chão.

A coisa vira esterco. Puro, asqueroso e inútil. Todos os nutrientes já foram sintetizados, de todas as formas possíveis.

- E esterco, mamãe, serve pra quê, hein?

Para nada. Nada, além de tornar a terra muito mais fértil para as novas sementes que virão. E para se misturar e sumir completamente em meio à areia tão fofinha.

Beijo especial e muitos, muitos mugidos.



¹ De "Excesso Exceto", de Lenine, em Labiata.

sábado, 28 de novembro de 2009

Poeticidade

"Mas a nós (...) só resta trapacear com a língua, trapacear a língua. Essa trapaça salutar, essa esquiva, esse logro magnífico que permite ouvir a língua fora do poder, no esplendor de uma revolução permanente na linguagem, eu a chamo, quanto a mim: literatura".

 Roland Barthes


As boas conversas são aquelas que fomentam o seu pensamento durante dias, semanas, meses. Que fazem as ideias virarem capim em estômago de vaca (esterco, esterco meu, existe alguém mais lírica do que eu?).


Fazia tempos que não pensava sobre essa coisa toda de poesia - ando afastada das paixões arrebatadoras como a literatura e como as paixões. Às vezes é necessário deixar de lado a inspiração pela transpiração, como corroboraria João Cabral.
Vá lá, há poucas coisas que excitam tanto quando ler uma coisa boa e escrever uma coisa boa ou trocar ideias boas sobre escrituras boas etc. ad infinitum.

Numa dessas trocas da vida, voltou a mim a fervilhada sobre as palavras e a poesia.

O problema do valor da palavra atinge tanto os meios pragmáticos de comunicação quanto os estéticos. Escolher a palavra certa pode render louros tanto quanto processos e serjetas sociais.
De qualquer forma, os nossos discursos são sempre elaborados em função do outro, porque queremos que ele concorde conosco. Queremos sempre a adesão narcísica a nosso modo de pensar.
A intencionalidade discursiva na poesia funciona de modo um pouco distinto: ela se relaciona à musicalidade. Ela tem, sobretudo, um apelo aos sentidos físicos e não apenas semânticos. Ela causa vertigem, sonho, mal-estar, tristeza, agonias. A poesia é uma produção estética, e, como tal, apesar de ter pressupostos e propósitos, tem uma função também sensorial.
E há gente que não gosta de poesia e eu só consigo entender isso usando a explicação de que essas pessoas simplesmente não entendem poesia. Como pode não gostar da linguagem no máximo e no mínimo grau? Pound (informe-se) e Barthes num cabo-de-guerra. Abstrações alienantes são ópio do povo dotado de neurônios e sensibilidade.

Roland Barthes (informe-se) escreveu sobre "O grau zero da escritura"; livro que nem li, por sinal. Mas em "Aula" (que eu li), ele diz por que acha que a literatura é a maior trapaceadora da linguagem. A linguagem, para ele, é um sistema fechado, com limitada liberdade. Eu sempre senti isso sem nunca ter sabido quem era Barthes e sempre falei pelos corredores da vida, e houve quem me chamasse de tudo, menos de bonita e descolada. A questão da representação literária ultrapassa as meras intencionalidades práticas discursivas, estas nas quais sempre se sobressai apenas o caráter narcisista do sujeito.

Olha só, neguinho, presta atenção: ser poeta é saber passar a perna na linguagem, é usar as palavras que o povão usa, revelando o mistério delas. Escondidinho. É fácil rimar com mitos gregos, com terminologias das ostras... Difícil é fazer lirismo com pá e enxada nesse latifúndio (informe-se).
E se tem alguém (além de Caeiro) que sabia fazer isso bonito era o amante Bandeira:


Namorados

O rapaz chegou-se para junto da moça e disse:
- Antônia, ainda não me acostumei com o seu corpo, com sua cara.
A moça olhou de lado e esperou.
- Você não sabe quando a gente é criança e de repente vê uma lagarta listrada?
A moça se lembrava:
- A gente fica olhando...
A meninice brincou de novo nos olhos dela.
O rapaz prosseguiu com muita doçura:
- Antônia, você parece uma lagarta listrada.
A moça arregalou os olhos, fez exclamações.
O rapaz concluiu:
- Antônia, você é engraçada! Você parece louca.

Ser poeta é dizer o óbvio como se fosse a maior novidade. E os poetas se reconhecem, não tem jeito. São todos lagartas listradas, parecem loucos.


Somos loucos. Listrados e gauches.

sábado, 21 de novembro de 2009

OK, Paranoid


Estava numa nostalgia danada do show de Radiohead que fui neste ano, em março, na querida e cinza terrinha de minha amigue Clá. Nem lembro se postei a respeito na época, mas já que meu blog morreu e ressuscitou, não há como saber agora.

Quem estava lá sabe que o show foi uma catarse coletiva. Impecável. Desde o cenário até a setlist  (que contemplou quase todo o In Rainbows e todos os melhores hits da banda, incluindo Creep e Fake Plastic Trees). Foi tudo perfeito, e isso não é confissão de uma fã cega. Thom Yorke, que parece meio estranho com aquele olho tosco, me surpreendeu, mostrando uma das melhores performances em palco. Faria Freddie Mercury sentir orgulho.
A colocação das câmeras no palco, resultando em imagens fodásticas no telão, mostrava cada um dos integrantes da banda. Um extremo cuidado da produção. Só louros.


   Thom Yorke: violão, voz, piano, latinhas e o que mais vier.



 
No telão, vários ângulos das caretas dele.                     




Esse revival me lembrou o orgasmo coletivo que aconteceu quando eles tocaram sobretudo Paranoid Android e Karma Police, ambas as canções de meu cd preferido, o "Ok, Computer".
O fato de esse ser meu cd favorito tem uma relação primeira com a estética dele, o estilo, enfim, toda a coisa musical e de identificação.
Mas algo muito curioso, que descobri depois de já amar o disco, é que ele foi feito em homenagem a "O Guia dos Mochileiros das Galáxias", de Douglas Adams, a bíblia nerd. O título "Ok, Computer" é uma referência a o que Zaphod Beeblebrox (o presidente das Galáxias) dizia sempre a seu computador, quando acatava as sugestões da máquina.
A música "Paranoid Android", a minha preferida, é dedicada a Marvin, o melhor personagem da série inglesa. Um robô depressivo só pode ser uma das maiores representações de sarcasmo já pensadas, e ele está lá no Guia.
Muitos amigos meus, que gostam de ambos (a banda e o livro), não sabiam dessa relação, o que me impulsionou a contar essa história aqui. Importante frisar que isso eu vi num programa da MTV, nos tempos remotos em que eu assistia a emissora.

Aproveito também para falar como estudante de teoria da literatura sobre essa série de livros. A mesma pessoa que lê Camões e adora a acuidade de Machado de Assis afirma que O Guia dos Mochileiros das Galáxias é uma das melhores obras dos tempos contemporâneos, sobretudo por sua leveza linguística, originalidade e humor inteligente.
Sem essa de que bests sellers não são obras de qualidade. Se você acha que esse livro é babaca pelo título parecer filme de adolescente, desconstrua isso já e pegue o primeiro livro da série para ler. Vale a pena.


 Marvin, o Androide Paranoide. 

De um modo geral, percebe-se na estética do "Ok, Computer", de Radiohead, muitos elementos que dialogam com o cosmos do livro de Douglas Adams. Nas músicas, o futurismo e a ficção extrapolam os limites do clichê e do lugar-comum. Radiohead consegue explorar os elementos eletrônicos sem sufocar o lirismo musical, misturando os instrumentos aos "crec-crecs" fabricados de uma maneira viciante.

Se eu já gostava do cd sem saber que ele era um diálogo com um de meus livros favoritos, depois de saber disso e de atestar pessoalmente a qualidade musical do Radiohead, Paranoid Android entrou para a tilha sonora da minha vida. Dignidade pura.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Rebundantes

"Repete-te para sempre, em todos os corações, em todos os mundos."

Cecília Meireles



Déjà'vu, Djavans, pressentimentos, apréssentimentos.

Escrever tem me causado uma sensação de repetição, de redundância contínua. Embora as pessoas novas não me achem clichê - afinal, é a primeira vez que me ouvem -, eu sei que eu já disse isso ou aquilo algumas vezes antes, a novidade em mim não existe para mim.
O mesmo tem acontecido quando vou escrever meus textos, com exceção dos acadêmicos, que normalmente são paráfrases de outros e não de mim mesma.
Cansa se repetir, mas, às vezes, quando menos se espera, pode-se repetir para alguém tão novo que a impressão é de que você é quem está novo, como uma paráfrase muito bem enfeitada, como palavras bonitas de poetas famosos.
Já disse também que vejo uma semelhança incrível entre química, literatura e gente, quando se pensa que as combinações infindas podem resultar em produtos novíssimos e inesperados. Sempre.

O que resta é ficar feliz por ser mais redundante que rebundante, como tantos por aí. Entenda-se o que quiser.


Discurso fragmentado é a velha moda do verão.

A lógica temporal é uma convenção babaca, mas da qual todos nós somos escravos. Às vezes. Noutras, a gente esquece dela.


Há palavras fermentando. Há palavras em mim. Mas há muito mais de mim nas palavras.

Sobretudo. Sobre tudo. Sobrar é bom, ruim é faltar.



Costura-se retórica. Onde?

As palavras são dedo-duras. Hard Rock Words. The word gets around.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

(Des)necessária


"Necessário, somente o necessário
O extraordinário é demais"


Mogli, o menino lobo



acessório
Datação: 1534

adjetivo
1 que se junta ao principal; suplementar, adicional, anexo
2 Derivação: por extensão de sentido.
que tem importância menor; secundário, dispensável

substantivo masculino
3 o que se junta ao principal, sem lhe ser essencial; detalhe, complemento, achega
4 peça ou objeto que serve de adorno ou complemento (p.ex., do vestuário, como cinto, bolsa etc.)


accessório; ver antonímia de necessário



Do Houaiss (adaptado).




Os acessórios também podem ser usados para adornar móveis. Como, por exemplo, um vaso ou um porta-retrato na estante. Com ou sem eles, a estante continua servindo para o que foi feita.
Quando estudamos sintaxe, aprendemos que há os termos integrantes e acessórios da oração. Os primeiros não podem faltar; os últimos podem existir ou não.
Os cintos - e como eu sinto! - passam de moda, e são deixados no fundo do closet. As bolsas, idem.

Ser ou sentir-se acessório é o maior pavor da que vos fala: a saudade é a contra-partida do esquecimento. Uma vez que não sentem a sua falta, você pode ser parte do grupo dos acessórios: o contrário do necessário; desnecessário.

O ostracismo é cruel. O esquecimento é muito pior do que o ódio. É pior do que se entrevar.



sábado, 31 de outubro de 2009

S.E.L. (Síndrome do Ex-Loser)

A Síndrome do Ex-Loser é muito mais prosaica do que alguns podem imaginar. O típico perfil psicológico dos seres acometidos pela doença é bem clichê.

Ele era uma criança ou adolescente fora dos padrões físicos europeus. Era tímido, gostava de atividades intelectuais e não era o melhor atacante do time de futebol. Usava aparelho e as roupas nunca lhe caíam bem (ou não sabia escolhê-las).
Na puberdade, as meninas nunca faziam festa para ele. Nas festinhas, ficava no canto do salão com seu grupo de amigos conversando sobre a campanha de RPG.
Eis que algum evento inusitado ocorre em sua vida e ele se dá conta de que o que quer mesmo é fazer parte da galera descolada que faz sucesso na cidade. Quer frequentar os shows de forró e ser disputado para dançar. Quer poder escolher entre as garotas disponíveis daquele grupo que conheceu na viagem, e não ficar com a única que sobrou.
A idade também ajuda: agora sua voz não oscila mais. Seus ombros estão mais largos e o remédio para espinhas finalmente fez efeito. Ele se matricula numa academia e começa a prestar atenção nas roupas que a "galera" descolada gosta de usar. Adicione isso ao fato de ter conseguido passar logo no vestibular, em curso badalado. Pronto! Ele já é um Ex-Loser!
A próxima etapa é sair pelo mundo como um rolo compressor, sem se importar com os problemas e sentimentos alheios. Punindo todos aqueles que não têm nada com o fato de sua vida, até então, ter sido um depósito de frustrações.


O problema dessa categoria de gente é o mesmo dos adultos em relação às crianças: eles esquecem que já foram pequenos um dia. Assim, passam a recriminar as atitudes infantis sem ao menos dar uma paradinha para refletir. Há quem diga que quando nos tornamos adultos é que ficamos idiotas. Eu digo o mesmo com os Ex-Losers.

Clá há tempos me indica um livro de Martin Page chamado "Como me tornei estúpido". Tenho a leve impressão de que ficarei viciada quando começar a ler, por isso não o fiz ainda. A linguística me consome.
Tornar-se estúpido é justo o procedimento de um Ex-Loser. Ele abandona tudo o que tinha de bom - a maneira peculiar de ver o mundo, os gostos peculiares, os amigos estranhos e engraçados - e passa a fazer parte de um mundo massificado, banal e desprezível. Ele passa a ser mais um.
Todo mundo quer ser incluído, se identificar. O problema é que alguns não conhecem limites para isso, tomando uma decisão quase sempre sem volta.

É engraçado como às vezes é fácil reconhecer o tipo Ex-Loser. É quase possível enxergar nele os vestígios de alguém realmente diferente e decente, mas ele não deixa a coisa transparecer por muito tempo, enterrando o seu ex-eu com uma boa camada de idiotice.

De acordo com dados experienciais e empíricos, eu daria o seguinte conselho para alguém que conhece gente assim e tem esperanças de resgatar o ser humano decente contido ali:

Se somente você enxerga uma pessoa e todos os outros não a veem, há somente duas hipóteses. Primeira: você tem esquizofrenia. Segunda: a pessoa não existe. (A segunda não exclui a primeira, ratifica).
Aprendi em psicologia que a realidade deve ser atestada por mais de uma testemunha para ser reconhecida oficialmente como tal.


Se só você consegue ver as valiosas e remanescentes qualidades especiais contidas naquele Ex-Loser, talvez elas não estejam mesmo mais lá. Talvez elas estejam apenas em você. Um original Loser, eterno e incurável (que bom).

E lembre-se: só Jesus salva. Não queira ser Jesus, ele só levou revés.

Beijos.

Aprés

Ouça um bom conselho
Eu lhe dou de graça
Inútil dormir que a dor não passa




Ela olha de lado, a cara amassada, os poros molhados, olhos dilatados.

Ele ri.

- Meu Deus, eu te amo tanto que parece que vou morrer. Estou sufocada.

Ele ri, dá um beijo em sua testa e dorme. Tranquilamente.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Ás às as

Alertaram!
Teu sentimento:
irmão de mármores
e amigo de ventos

E lá se perdeu
a borboleta
recém-nascida do meu casulo

E me perguntaram:
- Já não sabes mais voar?

Minhas asas
perdidas por lá

Passeiam sílfides
livres de mim
e eu estática
era tática do teu frio
duro, exato, vazio

Prossegue a procura
no escuro da tua caverna
escura

Cabra-cega

Onde não há Ariádnes
por onde Pandora espalhou
seu labirinto de males
Onde ficou perdido o detido
o batido das minhas asas esquecido

as asas que ganhei de presente de ti
as minhas asas
as que nunca mais eu vi.

sábado, 24 de outubro de 2009

Doçuras ou travessuras?

Ultimamente, tenho tido uma relação estranha com os doces. Nunca fui do tipo apaixonada pelos baloartes da glicose: sempre preferia um bom salgado a uma fatia de bolo. Não sei a partir de quando, mas essas coisinhas nocivas se tornaram meus objetos de amor e ódio; ou seja, de amor.

Resistir a uma fatia da torta preferida ou a uma tacinha do sorvete no congelador parece algo cada vez mais impraticável. E aquele pudim da vitrine do restaurante da universidade? (Ao menos a esse ainda tenho resistido).

Essa semana, na fila do caixa do restaurante, ao lado da vitrine dos doces, me lembraram de um texto que eu havia escrito, falando do pudim. Sobre o quanto era difícil a gente olhar aquele doce tão lindo, brilhante, e ter que dizer "não, obrigada"; mesmo sabendo que ele é delicioso e está totalmente disponível para o consumo. Eu escrevi aquilo para falar dos pudins, mas antes disso eu queria falar sobre o quanto é difícil tomar a decisão de não fazer algo que se quer, de que se gosta e que faz momentaneamente bem, como é o prazer de degustar um doce bom.

Os doces são assim como o amor. Eles trazem em sua essência essa ambiguidade angustiante da convivência entre prazer e nocividade. Assim como o amor, deve-se aprender a consumir doces na frequência e quantidade certas.

Mas, afinal, quando isso finalmente acontece?

Moody's vibes

- Ela parece confusa sobre se você e a mãe dela ainda estão juntos ou não.

- E não estamos todos?

- Ah, bem, é uma pena. Eu adoraria te arranjar alguém, um dia desses.

- Ah, eu agradeço a intenção, mas isso é uma causa perdida.

- Ah, é? Por quê?

- Bem, é meio que a minha punição, sabe? Jantar, bebidas, Deus sabe mais o quê. Mesmo não estando muito interessado, acabo dizendo o quão bonita ela é. Porque é a verdade. Todas as mulheres são, de uma forma ou de outra. Sempre tem alguma coisa em cada uma de vocês. Um sorriso, uma curva, um segredo. Vocês, senhoritas, são de fato as criaturas mais incríveis. O trabalho da minha vida. Mas aí chega a manhã seguinte. A ressaca. E o pensamento de que eu não estou tão disponível quanto eu achava que estava na noite anterior. E aí ela se vai. E aí eu sou assombrado por outro caminho não percorrido.

- Nossa, estou impressionada. Você parou com a palhaçada por um momento e falou algo de verdade.

- Eu faço isso, às vezes. Mas nunca tem como saber quando. Tem que prestar atenção.



______________


Quantos Hanks você conhece que fazem, mas não dizem, isso? Quanto os caminhos não percorridos o assombram?

Sabe... o melhor presente que o nosso discurso pode ganhar é o discurso de outrem.
Em algumas línguas, os substantivos fazem declinações de acordo com o tempo e com a sintaxe.

Só uma língua dessas poderia traduzir hoje o que eu estou sentindo: Ai, que saudade de mim no passado.

domingo, 18 de outubro de 2009

Se escreveu, não remeta

Por muito tempo achei que a ausência é falta. E lastimava, ignorante, a falta. Hoje não a lastimo. Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.

(C.D.A.)



Era uma vez uma garota que sentia saudades. Ela escrevia cartas para as pessoas, contava o seu dia, como tinha sido o último fim de semana e também falava as últimas notícias de sua vida. Pedia opinião, fazia piadinhas, lembrava momentos e até ria. Até parecia que a outra pessoa estava lá, perto dela. Depois, não remetia. E assim tudo se resolvia.


Fim


Os sentimentos de cada um são somente problema dele mesmo. Resolva os seus sozinho e faça o mínimo de barulho possível. E, se possível, quando sair, apague a luz.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Professora

Algumas pessoas falaram comigo hoje para me parabenizar pelo dia do professor. Para algumas eu disse: - Não sei bem se devo receber parabéns ou me alegrar por isso, mas muito obrigada, fico feliz com a sua delicadeza e atenção.

Como tenho mania de dicionários e como minha orientadora já publicou pesquisa sobre os gêneros nos verbetes de dicionários, está aqui o significado de professor e professora, segundo o Houaiss (que se lê "Uaiss" e não "Rauaiss"):

professor

substantivo masculino
1 aquele que professa uma crença, uma religião
2 aquele que ensina, ministra aulas (em escola, colégio, universidade, curso ou particularmente); mestre
Exs.: p. de matemática
p. de violão
p. adjunto
3 Derivação: sentido figurado.
indivíduo muito versado ou perito em (alguma coisa)

n adjetivo
4 que professa; profitente





Então, assim deve ser excelente ser professor. Então, estou feliz.



professora

substantivo feminino
1 mulher que ensina ou exerce o professorado
2 Regionalismo: Nordeste do Brasil. Uso: informal.
prostituta com quem adolescentes se iniciam na vida sexual


Como professora e nordestina, agradeço novamente a vocês e aos dicionários.
Que vida feliz.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Intermitência contínua

No peito, carrega iminências, intermitências, insistências.

Daquela, as possibilidades sempre quase em potências de mil, périplo ao redor do colchão. Viagem ao centro da cama.
Destas, a latência de um latejar: dor de dente e otite. Que passa e perpassa em intervalos temporais aleatórios, num minuto vago entre um riso e a companhia daqueles que apontam para um futuro bom.

E essa sensação de que o mundo dá voltas, as palavras dão voltas (wor(l)d gets around - e o inglês competente). E este arredondamento leva sempre ao centro de um dêitico aspiral que termina sempre no mesmo lugar: aí; ali; lá.
Onde tudo era impossível: só eu possível.



segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Inteligência e Felicidade Feminina

Já disse que a felicidade se põe num gráfico relativo à inteligência em uma posição inversamente proporcional. A questão da consciência faz do ser humano um pouco mais angustiado do que deveria com as coisas sobre as quais normalmente não tem poder algum.
Prova disso é o alto índice de suicídios de pessoas de filosofia (totalmente embasado este argumento, hein?). Sem brinks, o fato é que quanto mais temos consciência sobre o labirinto em que estamos imersos, é mais difícil ter esperanças e ser otimistas diante da História e dos fatos presentes. A caixinha de Pandora se abre para aqueles que são capazes de ver (e sentir, principalmente) um pouco mais além. É quase insuportável: então, você finge que nunca viu nem nunca abriu a caixa e segue em frente, se enganando e tomando sombra e sal.

Longe desta que vos fala se considerar o ápice da inteligência feminina, quando ela mesma conhece figuras como Hilst e Lispector que a colocariam num abismo obscuro se a comparassem com elas. Jamais. Mas se há a certeza de que existem mulheres muito mais inteligentes e fantásticas do que eu, há também a de que há ainda mais criaturas deprimentes. Fico com uma frase de twitter de Millôr Fernandes: "De uma coisa estou certo: sou bem pior do que os melhores – mas um pouquinho melhor que os piores".

Observando as histórias de vida das divas que mais amo, há uma constante. Nenhuma delas teve uma vida normal, no padrão social de felicidade. Nenhuma delas foi linearmente feliz no amor: desastres totais.
Hilda se apaixonou por figuras diversas. Uns viraram personagens de poesias, como o Dionísio da Ode Descontínua e Remota para Flauta e Oboé. Outros foram figuras famosíssimas, como Marlon Brando, este a quem ela não conseguiu seduzir. No fim de tudo, fica a pergunta: Hilda foi feliz no amor? Como saber?

Leminski tem um poemeto muito bonitinho e verdadeiro que diz:


Amor, então,
também, acaba?
Não, que eu saiba.
O que eu sei
é que se transforma
numa matéria-prima
que a vida se encarrega
de transformar em raiva.
Ou em rima.


Pelas rimas dela, vejo que jamais poderia ela ter sido feliz no amor, porque o "ouro de dentro" de que tanto falava não poderia permitir. Esse ouro era ela mesma, era essa sede dela pela vida, pelo conhecimento, pela busca de respostas.
Assim foi também com Clarice, que se definia como uma grande pergunta. Alguém que se pergunta tanto só pode passar a vida toda sozinha, porque não se podem encontrar respostas em ninguém.


Um amigo meu me disse que era muito bom conversar com mulher inteligente. Um dia, tempos atrás, eu e ele passamos um tempo grande conversando no MSN sobre dialética, sofismas e um punhado de assunto que ia se empilhando e dando voltas em outros. A conversa era bem interessante e exercitava os miolos de ambos. Trazia contribuição para a vida dos dois.
Ele disse que no mesmo dia tentou puxar o mesmo assunto na janela ao lado com uma ex-namorada dele, e ela simplesmente desconversou dizendo "lá vem você com essas conversas complicadas". Riu e o diálogo parou por ali nas primeiras frases.
Eu conheço de vista essa menina, e ela anda sempre feliz nos corredores, parece bem satisfeita. Ou seria só o verdume do muro ao lado?

Ainda não consegui achar vantagens em ser inteligente (ou um pouquinho melhor do que as piores). Elogios? "Conversar com você é fantástico!". E daí?
As pessoas sedentas por respostas costumam exigir muito das outras, como exigem da vida e de si mesmas. As outras não suportam isso, ainda mais os homens.

As mulheres inteligentes estão fadadas ao fracasso?

E se colocarmos roupinha de ginástica e pintarmos os cabelos de louro? E se usarmos salto cor-de-rosa com calça apertadinha? E se rirmos das coisas idiotas que nos dizem? E se enchermos o álbum do orkut de autofotos no espelho, mostrar decote e fazer caras e bocas? Um brinde ao lirismo! Aurea mediocritas. Um beijo, Horácio (informe-se).

Meu novo Houaiss grandão (obrigada, bônus do Governo de PE) diz assim:

felicidade

n substantivo feminino
1 qualidade ou estado de feliz; estado de uma consciência plenamente satisfeita; satisfação, contentamento, bem-estar
2 boa fortuna; sorte
Ex.: para sua f., o ônibus atrasou, e ele pôde viajar
3 bom êxito; acerto, sucesso
Ex.: f. na escolha de uma profissão


Consciência plenamente satisfeita só se for inconsciência, neguinho.


SORTE! SORTE! SORTE! SORTE!

Felicidade é sorte. Inteligência não.


É só isso. Não tem mais jeito. Acabou. Boa SORTE!


Ósculos e Amplexos. De amigo.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Se o caso é chorar... *

Que seja sempre terra o que é celeste
E que terrestre não seja o que é só terra.





Se é pra chorar, que seja por Vinícius de Moraes, que te troca por outra em um mês, mas escreve isso pra te dar:

Soneto de Devoção

Essa mulher que se arremessa, fria
E lúbrica aos meus braços, e nos seios
Me arrebata e me beija e balbucia
Versos, votos de amor e nomes feios.

Essa mulher, flor de melancolia
Que se ri dos meus pálidos receios
A única entre todas a quem dei os
Carinhos que nunca a outra daria.

Essa mulher que a cada amor proclama
A miséria e a grandeza de quem ama
E guarda a marca dos meus dentes nela.

Essa mulher é um mundo! - uma cadela
Talvez... - mas na moldura de uma cama
Nunca mulher nenhuma foi tão bela.




Sendo assim essa mulher, o que importam as outras?

Mas que seja infinito enquanto dure.


(Na poesia é tudo mais bonito)




* Título roubado de Tom Zé

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

As coisas chãs e vãs *

Não estou afim de bancar Champollion
E decifrar teus sonhos hieróglifos freudianos
Fruto de teu esfíngico inconsciente

Pois é o seguinte:
Não acho uma boa dormir no ponto
Dar uma de tonto
E vomitar pelos divãs
As coisas chãs e vãs
Tão próprias do cotidiano





Sabe-se que isto não é um twitter, mas deu vontade de que fosse.


O professor da nova academia é um tremendo babaca e eu gostaria de dizer isso a ele. Não me manda alongar e esquece de passar os abdominais. E ouve pagode. Céus, o que há com esse povo de Educação Física (área de saúde, em geral) que não pode ter BOM GOSTO e discernimento? CORPO SÃO, MENTE SÃ. Parece que eles só entendem a primeira parte do dito latino.


As filas dos bancos são de desanimar qualquer cidadão honesto. E a gente ainda paga a multa pelos dias em que ficou sem pagar a fatura do cartão porque: 1- O boleto não chegou, os Correios estavam em greve; 2- Não dava pra pagar no banco, os bancários estavam em greve.


Minha psicopatologia por Sigismund Freud adquiriu status preocupante na última terça. A pessoa passa duas horas de almoço falando de fase oral, anal e fálica e fica tentando explicar tudo através disso. Descobri que gente pirangueira ou muito EGOÍSTA e vaidosa (já vi essas três características juntas em um ser humano só, pasme) tem problemas com a fase anal. Então, se você se reconheceu aí, é bom perguntar a Freud o que houve com o seu... orifício corrugado localizado na região cervical infra-lombar, como diria a minha avó (sim, ela diz isso).
Sério, há um amor platônico de mim para Freud. Estou com medo.


Há um troço chamado florais terapêuticos e, ao que parece, eles funcionam. Se você tem FRESCURAS de pessoas sensíveis - que não têm mais espaço em nosso demente e autosuficiente mundo dos despreendidos e desapegados - tipo ansiedade, estresse, medo, blablabla, tome umas gotinhas por dia. Mal não faz.


Chá verde acelera o metabolismo, é o que dizem as pessoas do eme-esse-ene e do google. Tamo aí no chá.


Levar almoço e lanches de casa pro trabalho pode te fazer economizar uns 40 reais (às vezes mais) por semana. Isso dá 160 reais ao mês e quase dois mil reais ao ano. O único problema é você ter que andar com uma mochila cheia de comida o dia todo. O lado bom é que ela vai ficando mais leve (hehe, muito engraçada).
Com essa grana, você pode ir pro DF ver o show de Paul McCartney em Abril. Ops... será um problema meu com a fase anal? Ajude-me, Freud, vamos brincar de pai e filha.



Declarado o post mais idiota dessa nova temporada. Em homenagem a meu instrutor da academia.
Acabou.



* Referência à música Tal como Nazareth, do disco "Cadáver Pega Fogo Durante o Velório".

sábado, 26 de setembro de 2009

Vai: ser gauche na vida!



Hipótese


E se Deus é canhoto
e criou com a mão esquerda?
Isso explica, talvez, as coisas deste mundo.




Coisa boa de dar aula particular é que a gente aprende tudo por bem ou por mal. Há tempos, só vinha trabalhando redação e interpretação de texto com meu xodó particular, mas ele vem me dando tanto orgulho tirando nove em todas as redações, que achei por bem reforçar o conteúdo de literatura.

Aí vem aquela divisão didática ma-ra-vi-lho-sa (ironia, ok?) de fases modernistas. Segunda Fase do Modernismo: Poesia. Drummond, Cecília Meireles, Vinícius de Moraes, Murilo Mendes e Jorge de Lima, estes dois últimos bem deixados para segundo plano injustamente. Políticas literárias.

Foram duas horas lendo poemas drummonianos para entender o lirismo dele, interpretar, cantar, amar. É sempre a última etapa do estudo de Drummond: uma vez tendo entendido, não há como não se apaixonar.

Não podia deixar de ler a poesia-chefe da fase chamada gauche do autor, o Poema das Sete Faces.

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

Expliquei a meu aluno o que significava a palavra gauche, em francês, e o que significava o seu significado em português. Aliás, ele agora quer estudar francês também.

Lembrando do gauchismo drummoniano, me lembro sempre dos grandes circunlóquios que eu costumava (voltei a costumar) ter com Márcio Rodrigues. Ele sempre dizia, no meio de uma ou outra conversa, o último verso desta primeira estrofe do poema: "Vai, Carlos! Ser gauche na vida".
Tentei explicar que esse sentimento de gauche podia ser entendido como um deslocamento do ser diante do mundo, diante do comum. E que por mais que se mudassem as pessoas, os bigodes, os óculos, as roupas, esse sentimento continuaria lá, dando ao sujeito a sensação de que jamais estará em sintonia com o fluxo natural das coisas, acordando, vivendo, dormindo, amando, esquecendo.


Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo,
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.


Não seria uma solução. Não tem solução.


Esse gauchismo se manifesta em certo grupo de amigos meus, de modo que sempre chegamos à conclusão que não fomos feitos pra esse mundo, mesmo se tentarmos ser Raimundos. De qualquer forma, preferimos gostar disso, ao menos algumas dores parecem ser compensadas pela consciência de que não somos mais apenas um grão de farinha deste saco de um quilo vendido a preço de banana (que está sendo vendida a quilo agora, hein?).
E daí? E daí? Somos diferentes, somos isso, somos aquilo, e daí?

Por mais que eu queira, ainda não consigo ver grandes vantagens em pensar. A consciência é dolorosa. A memória é dolorosa.

O que nos pode consolar é que, ao que parece, esse anjo torto aí não apareceu somente para Carlos. Ele veio para Rita, Márcio, Marconi, Rebeka, Marília, Rafael, Felipe, Clarissa, Mirela, Aline, Daniel, Victor (...). Ele veio e disse: Ser gauches na vida! E alguém tratou de acrescentar o termo "juntos" ao lado, numa tipografia bem pequena e misteriosa.

O gauchismo solitário é coisa pra quem não conhece as pessoas certas. Temos apenas duas mãos e o sentimento do mundo. Não, nosso coração não é maior que o mundo, é bem menor. Deve ser por isso que ele doi tanto quando a gente sente tudo o que a gente não queria sentir.

E vamos ser gauches juntos, ao menos. Teremos duas, quatro, oito, dez... mãos dadas.

Como disse meu aluno (orgulho) espertinho: e se fôssemos centopéias? E se as poesias todas tivessem mãos?



A poesia é incomunicável.
Fique torto no seu canto.
Não ame.

(...)

Tudo é possível, só eu impossível.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Arrizotonia (risos)

Em um período de ócio laboral, uma boa pedida é abrir a Moderna Gramática Portuguesa de Evanildo Bechara para rever seus conhecimentos gramaticais por uma perspectiva menos gramatiqueira e mais linguística. Aceitei o desafio e, lutando contra as toneladas que pareciam imperar sobre minhas pálpebras, lia com atenção a parte sobre concordância dos verbos e nomes e sobre verbos defectivos, anômalos etc.

Alunos batem à porta da gráfica e meu companheiro de trabalho, responsável por fazer as cópias, não estava lá. Fui eu mesma, pois já aprendi a mexer na maquininha simpática.

Eram dois alunos de uma turma do primeiro ano da qual gosto bastante - aliás, é à que eu mais gosto de dar aula. Um garoto e uma garota, que sempre aparecem pela gráfica para xerocar algum material, fato pelo qual eu brinco sempre com eles.

- Vocês aqui de novo!
- Hahaha! É...

Peguei o livro que eles queriam xerocar, e comecei o serviço.

- Rita, você gosta de verbos?
- Gente, eu estava agora mesmo lendo sobre verbos! Que bizarro vocês me perguntarem isso... Estão estudando conjugação, é?
- É, é um saco! Esse negócio de pretérito perfeito, imperfeito, mais-que-perfeito...

- Rita, você já tinha esse piercing?
- Sim, sempre tive.

- Ah, gente. A diferença entre os pretéritos perfeito e imperfeito é simples. Tudo aquilo que parece não ter mais muita chance de acontecer de novo e que aconteceu um dia é imperfeito. Se eu falava, certamente não falo mais. Mas se eu falei, ninguém pode excluir a possibilidade de eu falar de novo, entenderam? É simples.
- Rita, você namora?
- Não.
- Namorava?
- Sim. Namorava.
- E não vai mais namorar, não é?
- Hehehe... muito bem, parece que vocês aprenderam direitinho.



Tenho certeza de que esses alunos jamais errarão quando o assunto for pretérito perfeito e imperfeito.

Existe algo melhor do que fatos pra nos ensinar sobre qualquer coisa?
Contra fatos não há verbos perfeitos, nem pretéritos, nem presentes, nem futuros.

Diálogos de uma pessoa só

- É, não sei bem o que vai acontecer, não sei se vai dar certo (...)
- Gata, não vou te dizer que vai dar errado. Mas invista na carreira solo. Garanta alguma coisa.
- É, eu sei...
- E se quiser esperar, espere. Mas não espere.



E dizem que o português é mais rico do que o inglês. Ao menos eles têm wait, expect e hope e nós, nós só podemos mesmo é esperar. Se eu falasse inglês, seria melhor compreendida em algumas ocasiões. Doutrinar é uma barra, quando se tem apenas uma palavra para uma infinidade de possibilidades.


P.S.: NÃO ME PEÇAM CONSELHOS.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Mugido

Não é possível que em nenhuma das minhas encarnações eu não tenha sido uma vaca. Vaca assim mesmo, no sentido denotativo da palavra, aquele ser que RUMINA as coisas eternamente.




Espero que pelo menos eu tenha morado na Índia nessa época, por favor.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Q/

O mundo é uma grande pergunta.

Qual o seu nome?
O que você quer ser?
Você já amou?
Você sabe o que é o amor?

Por que as pessoas ficam doentes?

Quem é Deus?

Você quer um pedaço?

Como estou dirigindo?

Quem sou eu?


Vinha conversando com um amigo no carro hoje, na volta de um cinema, e dizia a ele que era engraçado ser adulto e chegar no ponto em que se sente a necessidade de responder a si mesmo: onde eu quero chegar, daqui em diante? O que eu procuro? Com que objetivo eu irei trabalhar? Para quê? Para quem? Por quê?

A vida nos massacra com perguntas, mas ela também nos afaga. Devemos nos sentir valiosos, se somos capazes de fazer perguntas. Nós pensamos.

As respostas, às vezes, podem ser muito mais cruéis do que as questões delas.

Noite de domigo pode ser boa.

E vou dormir me abraçando e me cheirando e sentindo o meu cheiro novo tão bom, pelo qual estou apaixonada. Que bom que ele é meu, então. Obrigada.

Boa noite.

sábado, 12 de setembro de 2009

Espelhos



"Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu"


Ainda que os sistemas simbólicos façam parte de um universo condicionador e partilhado (o que se entende por sociedade), as percepções continuam passando através do filtro da individualidade.
Como este ou aquele escritor consegue dizer isto daquela forma? Inspiração?
Como aquele poema me veio naquela noite parecendo-se com um vômito ou um filho adulto?

As significações partidas de um eu-individual são a soma de experiências, leituras, falas, sonhos, relações, sinapses. A palavra que não é polissêmica e não tem tradução em nenhuma língua - nem mesmo na sua própria - explica algo que não é ímpar, mas passa a ser.

Este é o mistério da criação. É um equilíbrio mantido em ostracismo pela fórmula da palavra perfeita, do verso perfeito, da representação artística do que parecia impossível de ser estruturado em algo coerentemente realizável no mundo real dos homens.


Os símbolos existentes são finitos. Os possíveis não.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

A Fraude explícita explica

Cursando uma disciplina de Psicologia da Educação, cuja ementa é o desenvolvimento psicossocial, tenho lido, visto, ouvido e pensado sobre as coisas de Freud.

Anco Márcio (reverência) diz que não acredita em três coisas: seminário, Papai Noel e psicanálise.

Como sabemos todos, o tio Freud é chamado de pai da psicanálise e, cá pra nós, não tem palavra que mais se pareça com o Sigismund do que PAI. O foco aqui não é esse, senão passaria a vida falando de como eu penso que ele deveria ser o pai do machismo e não da psicanálise, whatever.

O fato é que essa coisa de terapias psíquicas têm rondado a minha vida constantemente durante os últimos tempos, por todos os lados. E depois de decidir que não vou vender minha alma por uma hora e meia mensal batendo papo com uma tiazona, pergunto a meu professor (que é psicólogo também, reflitão), com toda a falta de noção com a qual às vezes encaro esta bestialidade social: "- Afinal de contas, terapias psíquicas ou psicanalíticas servem pra quê? Freud acreditava na cura através do blá-blá-blá terapêutico?" (Sim, eu disse quase isso).

O professor riu, e disse que o próprio Freud perdeu o entusiasmo e no fim das contas nem acreditava mesmo na cura através da análise, devido à falta de sucesso de muitos de seus pacientes. Segundo meu professor, ele disse: "Se o sujeito já consegue amar e trabalhar, se dê por curado".

Se Freud falou um monte de perversão e baboseira especulativa em muito de sua obra, nessa última declaração ele se salvou do enforcamento em praça pública.

As terapias servem para alguém abalizado nos dar alguma explicação sobre sentimentos aos quais não conseguimos dar nexo lógico, ou explicar por que sentimos. O terapeuta diz: é isso. E mesmo não estando curado, pensar que encontrou uma resposta para a teia em que se estava enganchado é um alívio para o indivíduo. É quase a cura.

Sim, porque a cura só trabalhando. E amando de novo.
Existe meia-cura?



Moral da História 1.: Psicólogo bom é aquele que resolve seus problemas de 22 anos em duas sessões. Mesmo que você tenha pago 160 reais por isso.

Moral da História 2.: Psicólogo bom é um bom cabelereiro e uma boa compra de roupa em vez de pagar 160 reais por 1 hora e meia de papo sem futuro.

Moral da História 3.: Não existe coerência no meu texto.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Voltas às tortas

Sempre que ia a uma famosa rede de lojas de doces e donuts, pedia o mesmo sabor de torta. "Uma fatia de brownie com mousse de chocolate branco, por favor... capricha, tá?". Era a combinação perfeita entre a massa meio solada do brownie de chocolate com um recheio leve de chocolate branco, que escondia naquela maciez pedaços de chocolate meio-amargo, meu preferido.
Ainda nos tempos de colégio, comentei com uma amiga a minha insistência em repetir o sabor todas as vezes que voltava à doceria. Ela disse que eu precisava ousar mais, experimentar os outros sabores para ter mais propriedade e certeza de que o meu favorito era mesmo o melhor de todos. Isso mexeu com a minha cabeça. Descobri que era uma pessoa insegura (não que nunca tivesse desconfiado), do tipo que aproveita o mínimo das situações conhecidas por medo dos ônus das desconhecidas. Prossegui comendo a minha torta, fui inflexível.
Este episódio me perseguiu pelo resto da vida. Lembrava dele sempre que repetia o ritual da torta. Virou até piada minha com um amigo, tempos depois. Mas as piadas sempre têm um fundo de verdade intrinsecamente cruel. Passou-se tempo. Há pouco, resolvi ousar. "-Essa de morango com chocolate, pra variar". Ao terminar o processo degustativo, pensei: "A minha ainda é melhor". Outro dia, com outros amigos, fui na onda do Sonho de Valsa, também porque a minha estava em falta na loja em questão. Boa, mas na metade da fatia uma sensação de enjoo me invadiu. "A minha ainda é melhor".
As tortas são engraçadas. Quando se descobre a combinação perfeita a seu paladar, todas as outras parecem medíocres perto dela. Ousar? Experimentar? Dar a chance a novos e diferentes sabores? Sim. Para novamente constatar que o seu favorito ainda é melhor que todos. Para, enquanto se saboreia a torta de morango, pensar o tempo inteiro nas lascas de meio-amargo do recheio branco.
Quando não houver na loja o meu preferido, fico sem torta.
E, não, não precisa provar o azedo para saber que doce é muito bom.
Saudades da minha torta...
Torta? Eu é que sou.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Psicotrelelês

Fiz post de despedida e lá vou eu, no terceiro além dele.

É, se as decisões fossem assim estanques como as árvores (e olhe que elas andam caindo adoidado), a vida seguiria estrada reta pra over the rainbow.
Estou hoje aqui, escrevendo nada pra ninguém e isso me parece um autismo de quinta categoria.

O meu corpo tem delay, passados estresses e fortes emoções, dias depois aparecem os resultados. Febre, garganta, gânglios inchados no pescoço.

Todo mundo devia ir fazer terapia, é ótimo contar intimidade para estranhos e sentar na poltrona do vovô. E poder ficar falando só de si e dos seus problemas, sem ser interrompido com o problema do outro, que vai pedir sua opinião e ajuda.
O fato é que Miss S. vai ter que fazer um belo trabalho psicológico nesta aqui e penso que ela nem vai mais ligar pra marcar a próxima consulta, com medo da bomba.

Ela me fez duas perguntas, para as quais não tive resposta e estou matutando. Disse pra eu pensar e dizer na próxima semana. Tudo bem, meu maior medo é mesmo achar as respostas.

Falar é bom porque você se ouve e descobre coisas que você não sabia que pensava. O que também pode deixá-lo mais confuso, às vezes. Ops, estou confusa. Falar é mesmo bom?

Estava falando a uma amiga ontem de uma música de Chico Buarque que adoro muito, "Mil Perdões". Acho boa pra trabalhar a questão da coerência e antônimos não perfeitos (papo de professora FAIL) e ela diz assim, no final:

"Te perdoo
Por contares minhas horas
Nas minhas demoras por aí
Te perdoo
Te perdoo porque choras
Quando eu choro de rir
Te perdoo
Por te trair"


É a vida nesse lugar, a gente vai ter que pedir desculpas por amar e por ser gentil e por não ser egoísta e por querer o bem. Pode escrever: "Ops, desculpa pelo carinho, neijos".


Meu orkut disse hoje " Nunca deixe que os seus princípios impeçam você de fazer o que é certo".
Mas como eu vou saber se meus princípios me impedem de fazer o que é certo se julgo o que é certo justamente através dos meus princípios? Princípios, eu os perdoo por me traírem.


Pra quem corrigiu 100 textos em dois dias, pareço até sã.
Discurso fragmentado é a nova moda do verão.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Desmemoriados

Apaga-se a luz, o lápis, a tatuagem.

Apagam-se as velas, os números,

os recados, mensagens, poemas,

os cordéis desencantados.


Apagam-se as horas, respiros, zunidos,

risos.

Os conjuntos sem interseção.


Apagam-se as rosas,

as vermelhas, as brancas.

Apagam-se as palavras de malabares,

os bares, as sutilezas, afeição.


Apagaram-se os verbos no futuro,

do presente, eram presentes.

Ausentes.


Apega-se e não se apaga.

Por mais que se apaguem as coisas,

as lousas, as luzes.


Não se apagam.

E não se acabam.